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Sessão Saudade

O adeus a Murilo Melo Filho

Dois perfis

Arno Wheling (Cadeira 2. Na ABL, Cadeira 37)


“A ideia central do livro de Murilo Melo Filho sobre Rui Barbosa era a da pluralidade: não haveria um, mas vários Ruis e ele se propunha discutir as facetas mais importantes de uma vida múltipla.

É isso que precisamos fazer ao nos debruçarmos sobre Murilo Melo Filho: partir da constatação de que não houve um, mas vários Murilos.

O jornalista bem sucedido, que passou pelas principais redações do país, deixando sua marca na Tribuna da Imprensa, no Estado de São Paulo, na Manchete e na TV Rio. Jornalista que passou pela reportagem e pela crônica política, ao longo de muitas décadas do Brasil contemporâneo.



O potiguar inveterado, entranhadamente riograndense do norte, que se tornaria no Rio de Janeiro uma referência de seu estado. Aqui vivendo, não deixava de retornar à sua província com absoluta regularidade. E era excelente conhecedor de seu povo e de sua história, desde a capitania quinhentista até nosso tempo.

O cristão, intensamente cristão, que deu numerosos testemunhos de fé, reunindo em si as virtudes, teologais e cardeais.

O acadêmico, que pertencia a várias casas e participava da vida de muitas outras, porque era homem do convívio. Emblematicamente, foi membro das academias Riograndense de Letras, a terra natal, desta Academia Carioca de Letras, a terra adotiva e da Academia Brasileira de Letras, a pátria de todos nós.

O amigo, cordial e solícito, sempre pronto a dizer uma palavra de confiança, apoio e estímulo.

O brasileiro profundamente, visceralmente interessado no país, por todo o seu comportamento público e pelos livros que deixou. Participou de obras coletivas, escreveu, como não poderia deixar, sobre “o nosso Rio Grande do Norte”, biografou seus confrades acadêmicos Mucio Leão e Rui e publicou uma trilogia que de certa forma sintetiza as esperanças, as angústias e os dilemas de pelo menos duas gerações de brasileiros: “O desafio brasileiro”, “O modelo brasileiro” e “O progresso brasileiro”.

Se tivesse de escolher entre esses muitos Murilos para representá-lo, escolheria um deles, baseado no próprio Murilo Melo Filho. Ele intitulou seu livro sobre Rui, “O brasileiro Rui Barbosa”.

Nada mais justo do que sublinhar este traço de seu perfil: O brasileiro Murilo Melo Filho”.

 

Nelson Mello e Souza (Cadeira 11)


“Murilo era e sempre foi bem mais que um colega ameno, prestativo, solidário e suave, bem mais que um companheiro com quem compartíamos interesses comuns, em comentários e estudos literários, porque as letras, sua obsessão, ele sempre as cultivou desde os bancos universitários. Lembro-me que juntos debatíamos autores, os cronistas do dia, além dos gênios de sempre. Era nosso tema, num grupo do qual faziam parte, embora menos frequente, o brilhante Antônio Carlos Vilaça e o talentosíssimo já considerado, por todos nós como figura com perfil de gênio, Tarcísio Padilha.

Goethe chamou atenção para um fenômeno de ligação emotiva. Em formas diferentes, está na base das grandes amizades. Deu-lhes o nome conhecido de “afinidades eletivas”. Nunca logrei uma boa captação para este sentimento, mas sei, por saber vivido e sentido, que ele é parte básica de nossa condição social e emocional. Mesmo ante a passagem tumultuada do tempo, são afinidades que deixam marcas, criando fatos que jamais esquecemos e deixa melancolias solitárias que cultivamos em nossos silêncios.

No caso de Murilo e nosso grupo posso dizer que éramos ligados por... “Afinidades Eletivas”. E assim foi por toda a vida. A perda de um amigo que se faz amigo dentro deste conjunto encantado de consonâncias espirituais é uma perda que registramos em meio a emoções complicadas.

Lembro-me particularmente dos anos iniciais. Acabamos nos formando em universidades diferentes, mas o destino, este mago das surpresas, nunca nos afastou de todo, porque, no fundo, nossa trilha era a mesma, terminando por pertencermos à mesma Academia, a nossa Carioca de Letras.

Nesta época Murilo, sempre magrinho, esforçado e trabalhador, já se iniciava no jornalismo e quando Adolfo Bloch em conversa comigo, informou-me que convidara um jovem jornalista, sucesso da “Tribuna da Imprensa”, Murilo Melo Filho, para participar do grupo Bloch o felicitei com entusiasmo.



Murilo correspondeu plenamente. Foi um êxito completo na Manchete. Um dos pilares que manteve a revista no alto nível que ela logrou. Cada vez mais respeitado tornou-se nome conhecido e entrou, muito justamente, para a Academia Brasileira de Letras.

Juntos sempre acompanhamos as peripécias políticas de nosso Brasil e as aventuras literárias de tantos de nossos grandes escritores. Murilo sempre ponderado, mas sempre justo, destacava-se por comentários pertinentes e ângulos interessantes nos seus comentários. Equilíbrio, bom senso, perspicácia e talento sempre foram marcas de seus textos.

Pode-se resumir sua vida como a vida de um jovem audacioso que veio do seu Rio Grande do Norte para o Rio numa época imprecisa e difícil de transição getulista e, mesmo sem grandes contatos, por seu talento, venceu.

Termino com a certeza de que sua contribuição será sempre reconhecida como parte da construção da moderna imprensa brasileira. São muitas as saudades que ficam e muitas as emoções que nos envolvem, mas, acima de tudo e maior ainda, são as lembranças dos bons momentos que passamos juntos”.

 
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